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segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Meios de preparar-se para a morte

Memorare novissima tua, et in aeternum non peccabis.
Lembra-te de teus novíssimos, e não pecarás jamais (Ecl 7,40).



PONTO I

Todos cremos que temos de morrer, que só uma vez havemos de morrer e que não há coisa mais importante que esta, porque do instante da morte depende a eterna bem-aventurança ou a eterna desgraça.

Todos sabemos também que da boa ou má vida depende o ter boa ou má sorte. Como se explica, pois, que a maior parte dos cristãos vivem como se nunca devessem morrer, ou como se importasse pouco morrer bem ou mal? Vive-se mal porque não se pensa na morte: "Lembra-te de teus novíssimos, e não pecarás jamais." É preciso persuadirmo-nos de que a hora da morte não é o momento próprio para regular contas e assegurar com elas o grande negócio da salvação. As pessoas prudentes deste mundo tomam, nos negócios temporais, todas as precauções necessárias para obter tal benefício, tal cargo, tal casamento conveniente, e, com o fim de conservar ou restabelecer a saúde do corpo, não deixam de empregar os remédios adequados. Que se diria de um homem que, tendo de apresentar-se ao concurso de uma cadeira, esperasse, para adquirir a indispensável habilitação, até ao momento de acudir aos exercícios? Não seria um louco o comandante de uma praça que esperasse vê-la sitiada para fazer provisões de víveres e armamentos?

Não seria insensato o navegante que aguardasse a tempestade para munir-se de âncoras e cabos?... Tal é, todavia, o procedimento do cristão que difere até à hora da morte o regular o estado de sua consciência. "Quando cair sobre eles à destruição como uma tempestade... então invocar-me-ão e não os escutarei... Comerão os frutos do seu mau proceder" (Pr 1,27.28.31).

A hora da morte é tempo de confusão é de tormenta. Então os pecadores implorarão o socorro do Senhor, mas sem conversão verdadeira, unicamente com o receio do inferno, em que se vêem próximos a cair. É por este motivo justamente que não poderão provar outros frutos que os de sua má vida. "Aquilo que o homem semeou, isto também colherá" (Gl 6,8). Não bastará receber os Sacramentos, mas será preciso morrer detestando o pecado e amando a Deus sobre todas as coisas.

Como, porém, poderá aborrecer os prazeres ilícitos aquele que até então os amou?... Como amará a Deus sobre todas as coisas aquele que até esse instante tiver amado mais as criaturas do que a Deus? O Senhor chamou loucas - e na verdade o eram - as virgens que queriam preparar as lâmpadas quando já chegava o esposo. Todos temem a morte repentina, que impede regular as contas da alma. Todos confessam que os Santos foram verdadeiros sábios, porque souberam preparar-se para a morte antes que essa chegasse... E nós, que fazemos nós? Queremos correr o perigo de nos prepararmos para bem morrer, quando a morte nos estiver já próxima? Façamos agora o que nesse transe quiséramos ter feito... Oh! quanto é terrível então recordar o tempo perdido, e sobretudo o tempo mal empregado!... O tempo que Deus nos concedeu para merecer, mas que passou para nunca voltar.

Que angústia nos dará o pensamento de que já não é possível fazer penitência, freqüentar os sacramentos, ouvir a palavra de Deus, visitar Jesus Sacramentado, fazer oração! O que está feito, está feito (Lc 16,21).

Seria necessário ter então mais presença de espírito, mais tranqüilidade e serenidade para confessar-se bem, para dissipar graves escrúpulos e tranqüilizar a consciência... mas já não é tempo! (Ap 10,6).

AFETOS E SÚPLICAS

Ó meu Deus! se tivesse morrido naquela ocasião que sabeis, onde estaria eu agora? Agradeço-vos o terdes esperado por mim e por todo esse tempo que deveria ter passado no inferno, desde o momento em que vos ofendi. Dai-me luz e conhecimento do grande mal que fiz, perdendo voluntariamente vossa graça, que merecestes para mim com o sacrifício da cruz... Perdoai-me, meu Jesus, que me arrependo de todo o coração e sobre todos os males de ter menosprezado vossa bondade infinita. Espero que já me haveis perdoado... Ajudai-me, meu Salvador, para que não volte a perder-vos jamais... Ah! Senhor! Se tornasse a vos ofender depois de ter recebido de vós tantas luzes e tantas graças, não mereceria um inferno criado de propósito para mim?... Não o permitais pelos merecimentos do sangue que por mim derramastes! Dai-me a santa perseverança; dai-me vosso amor... Amo-vos, meu Sumo Bem; jamais quero deixar de vos amar. Tende, meu Deus, misericórdia de mim, pelo amor de Jesus Cristo. Recomendai-me a Deus, ó Virgem Maria! que vossos rogos nunca são desatendidos por esse Senhor que tanto vos ama.

PONTO II

Já que é certo, meu irmão, que tens de morrer, prostra-te aos pés do Crucifixo; agradece-lhe o tempo que sua misericórdia te concede para regular tua consciência, e passa em revista a seguir todas as desordens de tua vida passada, especialmente as de tua mocidade. Considera os mandamentos Divinos: recorda os cargos e ocupações que tiveste, as amizades que cultivastes; anota tuas faltas e faze - se ainda a não fizeste - uma confissão geral de toda a tua vida... Oh! quanto contribui a confissão geral para pôr em boa ordem a vida de um cristão.

Cuida que essa conta sirva para a eternidade, e trata de resolvê-la como se a apresentasses no tribunal de Jesus Cristo. Afasta de teu coração todo afeto mau e todo rancor ou ódio. Satisfaze qualquer motivo de escrúpulo acerca dos bens alheios, da reputação lesada, de escândalos dados, e propõe firmemente fugir de todas as ocasiões em que possas perder a Deus. Pensa que aquilo que agora parece difícil, impossível te parecerá no momento da morte.

O que mais importa é que resolvas pôr em execução os meios de conservar a graça de Deus. Esses meios são: ouvir Missa diariamente; meditar nas verdades eternas; fazer, ao menos uma vez por semana, a confissão e receber a comunhão; visitar todos os dias o Santíssimo Sacramento e a Virgem Maria; assistir aos exercícios das congregações ou irmandades a que pertenças; praticar a leitura espiritual; fazer todas as noites exame de consciência; escolher alguma devoção especial à Virgem, como jejuar todos os sábados, e, por fim, propor recomendar- se a Deus e à sua Mãe Santíssima, invocando a miúdo, sobretudo no tempo da tentação, os santíssimos nomes de Jesus e Maria.

Tais são os meios com que podemos alcançar uma boa morte e a salvação eterna.

Exercer essas práticas será sinal evidente de nossa predestinação.

Pelo que diz respeito ao passado, confiai no sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo, que vos dá estas luzes porque quer salvar-vos, e esperai na intercessão de Maria, que vos obterá as graças necessárias. Com a vida assim regulada, e a esperança posta em Jesus e Maria, quanto nos ajuda Deus, e que força não adquire a alma! Coragem, pois, meu leitor, entrega-te todo a Deus, que te chama, e começa a gozar dessa paz que até agora, por culpa tua, não experimentaste. Pode, porventura, uma alma desfrutar paz maior que a de poder dizer todas as noites, ao descansar: se viesse esta noite a morte, morreria, segundo espero, na graça de Deus!? Que consolação se, ao ouvir o fragor do trovão, ao sentir a terra tremer, pudermos esperar resignadamente a morte, se Deus assim o tiver determinado!

AFETOS E SÚPLICAS

Quanto vos agradeço, Senhor, as luzes que me dais!... Não obstante ter eu tantas vezes vos abandonado e me afastado de vós, não me abandonastes. Se o tivésseis feito, cego estaria eu, como quis sê-lo na vida passada; encontrar-me-ia obstinado em minhas culpas, e não teria vontade nem de renunciar a elas nem de vos amar. Sinto agora dor grandíssima de vos ter ofendido, vivo desejo de estar na vossa graça, e profundo aborrecimento daqueles malditos prazeres que me fizeram perder vossa amizade. Todos estes afetos são graças que de vós procedem e que me induzem a esperar que queirais me perdoar e me salvar... É, pois, a vós, Senhor, que, apesar de meus muitos pecados, não me abandonais e desejais minha salvação, que me entrego inteiramente; aflige-me de todo o coração o ter-vos ofendido, e proponho querer antes perder mil vezes a vida do que vossa graça... Amo-vos, Soberano Bem; amo-vos, meu Jesus, que por mim morrestes, e espero por vosso preciosíssimo sangue que jamais tornarei a afastar-me de vós.

Não, meu Jesus, não quero perder-vos outra vez, mas sim amar-vos eternamente. Conservai sempre e aumentai meu amor para convosco, o que vos suplico pelos vossos próprios merecimentos...

Maria, minha esperança, rogai por mim a Jesus!

PONTO III

É necessário o cuidado de nos acharmos em qualquer tempo, como quiséramos estar na hora da morte. "Bem-aventurados os mortos que morrem no Senhor" (Ap 14,13). Diz Santo Ambrósio que morrem felizmente aqueles que ao morrer já estão mortos para o mundo, ou seja desprendidos dos bens que por força então hão de deixar. Por isso, é necessário que desde já aceitemos o abandono de nossa fazenda, a separação de nossos parentes e de todos os bens terrenos. Se não o fizermos voluntariamente durante a vida, forçosa e necessariamente o teremos de fazer na morte, com a diferença de que então não será sem grande dor e grave perigo de nossa salvação eterna. Adverte-nos, neste propósito, Santo Agostinho, que constitui grande alívio, para morrer tranqüilo, regular em vida os interesses temporais, fazendo previamente as disposições relativas aos bens que temos de deixar, a fim de que na hora derradeira somente pensemos em nossa união com Deus. Convirá então só ocupar-se das coisas de Deus e da glória, pois são demasiadamente preciosos os últimos momentos da vida para dissipá-los em assuntos terrenos. No transe da morte se completa e se aperfeiçoa a coroa dos justos, porque é então que se recolhe a melhor soma de méritos, abraçando as dores e a própria morte com resignação ou amor.

Mas não poderá ter na morte estes bons sentimentos quem neles não se exercitou durante a vida. Para este fim alguns fiéis praticam, com grande aproveitamento, a devoção de renovar em cada mês o protesto da morte, com todos os atos em tal transe próprios de um cristão, e isto depois de receber os sacramentos da confissão e comunhão, imaginando que se acham moribundos e a ponto de sair desta vida.

O que se não faz na vida, difícil é fazê-lo na morte. A grande serva de Deus, irmã Catarina de Santo Alberto, filha de Santa Teresa, suspirava na hora da morte, exclamando: "Não suspiro, minhas irmãs, por temor à morte, pois há vinte e cinco anos que a espero; suspiro porque vejo tantos pecadores iludidos que esperam para reconciliar-se com Deus até à hora da morte, quando apenas poderão pronunciar o nome de Jesus".

Examina, pois, meu irmão, se teu coração tem apego a qualquer coisa da terra, a determinadas pessoas, honras, riquezas, casa, sociedade ou diversões, e considera que não hás de viver aqui eternamente.

Virá o dia, talvez próximo, em que deverás deixar tudo. Por que, neste caso, manter o afeto nessas coisas, correndo risco de ter morte inquieta?...

Oferece-te, desde já, por completo a Deus, que pode, quando lhe aprouver, privar-te desses bens. Quem quiser morrer resignado, há de ter resignação desde agora em todos os acidentes contrários que lhe possam suceder; e há de afastar de si os afetos às coisas da terra. - Afigura-te que vais morrer - diz São Jerônimo - e facilmente conseguirás desprezar tudo.

Se ainda não escolheste estado de vida, toma aquele que na hora da morte quererias ter escolhido e que possa proporcionar-te um trânsito mais consolador à eternidade. Se já tens um estado, faze tudo que ao morrer quiseras ter feito nesse estado. Procede como se cada dia fosse o último da vida, cada ação a derradeira que praticas; a última oração, a última confissão, a última comunhão. Imagina que estás moribundo, estendido sobre o leito, e que ouves aquelas palavras imperiosas: Sai deste mundo. Quanto estes pensamentos nos podem ajudar a caminhar bem e a menosprezar as coisas mundanas! "Bem-aventurado aquele servo, a quem o seu senhor, quando vier, achar procedendo assim" (Mt 24,46). Aquele que espera a toda hora a morte, ainda que esta venha subitamente, não pode deixar de morrer bem.

AFETOS E SÚPLICAS

Todo cristão, quando se lhe anuncia a hora da morte, deve estar preparado para dizer o seguinte: Senhor, restam-me poucas horas de vida; quero empregá-las em amar-vos quanto posso, para entrar na eternidade amando-vos. Pouco me resta para vos oferecer, mas ofereço-vos estas dores e o sacrifício que vos ofereceu por mim Jesus Cristo na cruz. Poucas e breves são, Senhor, as penas que padeço, em comparação com as que hei merecido; mas, tais como são, abraço-as em sinal do amor que vos tenho.

Resigno-me a todos os castigos que me queirais infligir nesta e na outra vida. Contanto que possa amar-vos eternamente, castigai-me quanto vos aprouver. Peço não me priveis de vosso amor. Reconheço que não mereço amar-vos por haver tantas vezes desprezado o vosso amor, mas vós não podeis repelir uma alma arrependida. Pesa-me, ó Suma Bondade, de vos ter ofendido. Amo-vos com todas as veras do meu coração, e em vós deposito toda a minha confiança, ó Redentor meu! Nas vossas mãos chagadas encomendo a minha alma... Ó meu Jesus, para salvar-me derramastes todo o vosso sangue. Não permitais que me aparte de vós (Sl 30,6). Amo-vos, Eterno Deus, e espero amar-vos durante toda a eternidade... Virgem e Mãe minha, ajudai-me na minha última hora! Entrego-vos minha alma! Dizei a vosso Filho que tenha piedade de mim! A vós me recomendo: livrai-me da condenação eterna!


Santo Afonso Maria de Ligório: "Preparação para a Morte".


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segunda-feira, 23 de setembro de 2013

ENTRADA DA ALMA NO CÉU

I. Oh Deus! Que dirá a alma ao entrar no reino bem-aventurado do Céu? Imaginemos ver morrer essa virgem, esse jovem, que, tendo-se consagrado ao amor de Jesus Cristo, e, chegada a hora da morte, vai deixar esta terra. Sua alma apresenta-se para ser julgada; o Juiz acolhe-a com bondade e lhe declara que está salva. O seu Anjo da guarda vem ao seu encontro e mostra-se todo contente; ela lhe agradece toda a assistência recebida, e o anjo responde-lhe: Alegra-te, alma formosa; já estás salva; vem contemplar a face do teu Senhor.

Eis que a alma se eleva acima das nuvens, acima do firmamento e de todas as estrelas: entra no Céu. Que dirá ao penetrar pela primeira vez nessa pátria bem-aventurada, ao lançar o primeiro olhar sobre essa cidade de delícias? Os Anjos e os Santos saem-lhe ao encontro e lhe dão, jubilosos, as boas vindas. Que consolação experimentará ao encontrar ali os parentes e amigos que a precederam, e os seus gloriosos protetores! A alma quererá prostrar-se diante deles; mas os Santos lhe dirão: Guarda-te de o fazer; porque somos servos como tu: “Vide ne feceris; conservus tuus sum”.

Ela irá depois beijar os pés de Maria, a Rainha do paraíso. Que ternura não experimentará ao ver pela primeira vez essa divina Mãe, que tanto a ajudou a salvar-se! Então a alma verá todas as graças que Maria lhe alcançou. A Rainha celestial abraça-a amorosamente e a conduz a Jesus que a acolhe como esposa e lhe diz: “Veni de Libano, sponsa mea; veni, coronaberis” (“Vem do Líbano, esposa minha; vem, serás coroada”). Regozija-te, esposa querida, passaram já as lágrimas, as penas, os temores: recebe a coroa eterna que te alcancei a preço de meu sangue. Ah, meu Jesus! Quando chegará o dia em que eu também ouvirei de tua boca estas doces palavras?


II. Jesus mesmo acompanhará a alma bem-aventurada afim de receber a bênção de seu Pai divino, que a abraçará carinhosamente e a abençoará, dizendo: “Intra in gaudium Domini tui” (“Entra no gozo do teu Senhor”), e então fa-la-á participar da sua própria gloriosa beatitude.

Meu Deus, aqui tendes a vossos pés um ingrato, que foi criado por Vós para o Céu, mas que muitas vezes, na vossa presença, o renunciou por indignos prazeres, consentindo em ser condenado ao inferno. Espero que já me haveis perdoado todas as injúrias que Vos fiz e de que de novo me arrependo e quero arrepender-me até à morte. Quero também que Vós sempre as torneis a perdoar-me. Mas, ó Jesus, embora já me tenhais perdoado, sempre ficará sendo verdade que tive a audácia de amargurar-Vos, meu Redentor, que, para me conduzir ao vosso reino, sacrificastes a própria vida. Para sempre seja louvada e abençoada a vossa misericórdia, ó meu Jesus, que me haveis aturado com tamanha paciência, e que, em vez de me punir, multiplicastes para comigo as graças, as luzes e os convites.

Vejo, meu amantíssimo Salvador, que quereis deveras a minha salvação; quereis ver-me em vosso reino para eu Vos amar eternamente; mas quereis que primeiramente Vos ame nesta terra. Sim, quero Vos amar. Ainda que não houvesse paraíso, quisera amar-Vos por toda a vida, com toda a minha alma, com todas as minhas forças. Basta-me saber que Vós, meu Deus, desejais ser amado por mim. Assisti-me, meu Jesus, com a vossa graça; não me abandoneis. Minha alma é eterna; estou, pois, na alternativa de Vos amar ou de Vos odiar eternamente! O que eu quero é amar-Vos eternamente; quero amar-Vos muito nesta vida para Vos amar muito na outra. Disponde de mim como Vos aprouver; castigai-me como quiserdes; não me priveis do vosso amor, e depois fazei de mim segundo a vossa vontade. Meu Jesus, os vossos méritos são a minha esperança. Ó Maria, ponho toda a minha confiança na vossa intercessão. Livrastes-me do inferno, quando estava em pecado; agora, que desejo só a Deus, deveis salvar-me e tornar-me santo.

SANTO AFONSO MARIA DE LIGÓRIO: “Meditações para todos os dias e festas do ano” – Tomo III.


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sexta-feira, 20 de setembro de 2013

Aprenda a fazer uma horta em apenas um metro quadrado

Hoje, um pouco de boa saúde à mesa. Garimpado na net, em um site greenfrienfly, interessante, ma repetimos que não somos ecochatos nem à favor das eco-chatices! 




Muitas pessoas que têm pouco espaço em casa acham que não é possível cultivar seus próprios alimentos. Mas, paisagistas ensinam que mesmo em pequenos ambientes é possível fazer hortas caseiras.

Em 2011, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), mostrou que 28% dos vegetais consumidos no Brasil  possuem resíduos de agrotóxicos em níveis inaceitáveis. A alternativa então é cultivar seus próprios orgânicos, mesmo que o espaço seja pequeno.

Hoje, o CicloVivo separou o sistema do SERPAR (Serviço de Parques de Lima, no Peru) que ensina a cultivar uma horta quase completa ocupando apenas um metro quadrado.

Ideal para pequenos espaços, esta horta é cada vez mais popular entre os jardineiros urbanos. Ela é suficiente para o abastecimento diário de legumes de uma pessoa por um mês.

Por ocupar um pequeno espaço, a horta permite que o cultivador alcance toda ela para plantar, regar e colher, sem que precise de muito esforço. Além disso, é possível trabalhar na horta ao nível da cintura, o que facilita o cultivo por deficientes físicos.

Este sistema de cultivo é dividido entre quadrados e retângulos menores. Cada espaço tem um legume ou erva diferente.

Veja quais alimentos você pode cultivar e suas categorias:
  Plantas pequenas: Rabanete, cenoura, cebola, espinafre, beterraba, alface e salsa.
Plantas grandes: Repolho, brócolis, couve-flor, berinjela e pimentas.
Plantas verticais: Tomate, pepino, vagem, ervilha e feijão.

Imagem: SERPAR (Serviço de Parques de Lima, Peru)

Na construção da estrutura podem ser usados tubos de ferro ou de PVC utilizados em alambrados ou também é possível adaptar e reutilizar algum outro material, como pedaços de madeira.

As plantas maiores ficam nas fileiras de trás e as menores, na frente, para que todas recebam a luz do sol. As plantas verticais, como os tomates, devem ser penduradas na estrutura. Amarre-as bem para que suportem o peso e o vento.

A rotação de cultivos é automática. Por exemplo, um cultivo que leva mais tempo, como o do tomate, pode ser plantado entre outros cultivos de colheita rápida e que seriam colhidas antes que a planta precise de mais espaço.
  Visto em: http://ciclovivo.com.br/noticia/aprenda_a_fazer_uma_horta_em_apenas_um_metro_quadrado.



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segunda-feira, 16 de setembro de 2013

Da Salvação de Nossa Alma

Santo Afonso Maria de Ligório


« A salvação eterna não é só o mais importante,
senão o único negócio que nesta vida nos impende »
(Lc 10,42)

O negócio da eterna salvação é, sem dúvida, o mais importante, e, contudo, é aquele de que os cristãos mais se esquecem!.

Não há diligência que não se efetue, nem tempo que não se aproveite para obter algum cargo, ganhar uma demanda, ou contratar tal casamento... Quantos conselhos, quantas precauções se tomam! Não se come, não se dorme!... E para alcançar a salvação eterna? O que se faz?

Nada se costuma fazer; ao contrário, tudo o que se faz é para perdê-la, e a maior parte dos cristãos vive como se a morte, o juízo, o inferno, a glória e a eternidade não fossem verdades de fé, mas apenas fábulas inventadas pelos poetas.

Quanta aflição quanto se perde um processo ou uma colheita e quanto cuidado para reparar o prejuízo!... Quando se extravia um cavalo ou um cão, quantas diligências para encontrá-los. Muitos perdem a graça de Deus, e entretanto dormem, riem e gracejam!...

“Mas vós, disse São Paulo, vós, meus irmãos, pensai unicamente no magno assunto de vossa salvação, pois constituiu o negócio da mais alta importância”. É, sem contestação, o negócio mais importante, porque é das mais graves conseqüências, em vista de se tratar da alma, e, perdendo-se esta, tudo está perdido. Devemos estimar a alma – disse São João Crisóstomo, como o mais precioso dos bens. Para compreender esta verdade, basta considerar que Deus sacrificou seu próprio Filho à morte para salvar nossas almas (Jo 3,16). O Verbo Eterno não vacilou em resgatá-las com seu próprio sangue (I Cor 6,20).

Daí esta palavra de Nosso Senhor Jesus Cristo: “Que dará o homem em troco de sua alma?” (Mt 16,26). Se tem tamanho valor a alma, qual o bem do mundo que poderá dar em troca o homem que a vem a perder?

Razão tinha São Filipe Neri em chamar de louco o homem que não trabalhava na salvação de sua alma. Se houvesse na terra homens mortais e homens imortais e aqueles vissem estes se aplicarem afanosamente às coisas do mundo, procurando honras, riquezas e prazeres terrenos, dizer-lhes-iam sem dúvida: « Quanto sois insensatos! Podeis adquirir bens eternos e só pensais nas coisas miseráveis e passageiras, condenando-vos a penas eternas na outra vida!... Deixai-os, pois, nesses bens s´´o devem pensar os desventurados que, como nós, sabem que tudo se acaba com a morte!... ». Isto, porém, não é assim: todos somos imortais...

A salvação eterna não é só o mais importante, senão o único negócio que nesta vida nos impende (Lc 10,42). “Que aproveita ao homem, disse o Senhor, ganhar o mundo inteiro e perder a sua alma? (Mt 16,26).

Se tu te salvas, meu irmão, nada importa que no mundo hajas sido pobre, perseguido e desprezado. Salvando-te, acabar-se-ão os males e serás feliz por toda a eternidade. Mas se te enganares e te perderes, de que te servirá no inferno haveres desfrutado de todos os prazeres do mundo, teres sido rico e cortejado? Perdida a alma, tudo está perdido: honras, divertimentos e riquezas.

Dirá Deus para ti no dia do Juízo, que coloquei-te neste mundo não para divertir-se, nem enriquecer, nem adquirir honras, senão para salvar sua alma, infelizmente a tudo tu atendeste, menos à salvação de tua alma!

Os mundanos não pensam no presente e nunca no futuro. Este é o único negócio, porque só temos uma alma. “Com receio e com tremor, trabalhai na vossa salvação” (Fl 2,12). Quem não receia nem teme perder-se não se salvará, porque para se salvar é preciso trabalhar e empregar violência (Mt 11,12).

Negócio importante, negócio único, negócio irreparável. Não há falta que se possa comparar, diz Santo Eusébio, ao desprezo da salvação eterna. Todos os demais erros podem ter remédio.

Perdido os bens, é possível readquirir outros por meio de novos trabalhos. Perdido um emprego, pode ser recuperado. Ainda no caso de perder a vida, se salvar a alma, tudo está preparado. Mas, para quem, se condena, não há possibilidade de remédio. Morre-se uma vez, e perdida uma vez a alma, está perdida para sempre.

Só restará o pranto eterno com os outros míseros insensatos do inferno, cuja pena e maior tormento consiste em pensar que para eles já não há mais tempo de remediar sua desdita (Jr 8,20). qual não seria o pesar daquele, que, tendo podido prevenir e evitar com pouco esforço a ruína de sua casa, a encontrasse um dia desabada, e só então considerasse seu descuido, quando não houvesse já remédio possível?

E se alguém objetar: Mesmo que cometa este pecado, porque ei de condenar-me?... Acaso, não poderei salvar-me? Responder-lhe-ei: Também pode ser que te condenes. Ainda direi que até há mais probabilidade em favor de tua condenação, porque a Sagrada Escritura ameaça com este tremendo castigo os pecadores obstinados, como tu o és neste instante. “Ai dos filhos que desertam!” (Is 30,1), diz o Senhor. “Ai daqueles que se afastam de mim” (Os 7,13).

E não pões ao menos, com esse pecado cometido, a tua salvação eterna em grande perigo e grande incerteza? E qual é esse negócio que assim se pode arriscar? Não se trata de uma casa, de uma cidade, de um emprego; trata-se, diz São João Crisóstomo, de padecer uma eternidade de tormentos e de perder um paraíso de delícias. E esse negócio, que tanto te deve importar, queres arriscá-lo por um “talvez”? Acaso, esperas que Deus aumente para ti suas luzes e suas graças depois que tu hajas aumentado ilimitadamente tuas faltas e pecados?

O dia da morte é chamado o dia da perda, porque perdermos as honras, as riquezas e os prazeres, enfim, todos os bens terrenos. Por esta razão diz Santo Ambrósio que não podemos chamar nossos, esses bens, porque não podemos levá-los conosco para o outro mundo; somente as virtudes nos acompanham para a eternidade.

“De que serve, pois, ganhar o mundo inteiro, se à hora da morte, perdendo a alma, tudo perde?”... Oh! Quantos jovens, penetrados desta grande máxima, resolveram entrar na clausura! Quantos anacoretas conduziu ao deserto! A quantos mártires moveu a dar a vida por Cristo!

Por meio destas máximas soube Santo Inácio de Loyola chamar para Deus inúmeras almas, entre elas a alma formosíssima de São Francisco Xavier que, residindo em Paris, ali se ocupava em pensamentos mundanos. “Pensa, Francisco, lhe disse um dia o Santo, pensa que o mundo é traidor, que promete e não cumpre; mas ainda que cumprisse o que promete, jamais poderia satisfazer teu coração. E supondo que o satisfizesse, quanto tempo poderá durar essa felicidade? Mais que tua vida? E no fim dela, levarás tua dita para a eternidade? Existe, porventura, algum poderoso que tenha levado para o outro mundo uma moeda sequer ou um criado para seu serviço?...” Movido por estas considerações, São Francisco Xavier renunciou ao mundo, seguiu Santo Inácio de Loyola e se tornou um grande santo.

É mister pesar os bens na balança de Deus e não na do mundo, que é falsa e enganadora (Os 12,7). Os bens do mundo são desprezíveis, não satisfazem e acabam depressa. “Meus dias passaram mais depressa que um correio; passaram como um navio...” (Jo 9,25)

Passam e fogem velozes os breves dias desta vida; e o que resta por fim dos prazeres terrenos? Passaram como navios. O navio não deixa vestígio de sua passagem (Sb 5,10).

“O tempo é breve...os que se servem do mundo, sejam como se dele não se servissem, porque a figura deste mundo passa...” (I Cor 7,31). Procuremos, pois, viver de maneira que à hora de nossa morte não se nos possa dizer o que se disse ao néscio mencionado no Evangelho: “Insensato, nesta noite há de exigir de ti a entrega de tua alma; e as coisas que juntaste, para que serão?” (Lc 12,20). E logo acrescenta São Lucas: “Assim é que sucede a quem enriquece para si, e não é rico aos olhos de Deus” (Lc 12,21).

Mais adiante diz: “Procurai entesourar para o céu, onde não chegam os ladrões nem rói a traça” (Mt 6,20).

Façamos, pois todo o esforço para adquirir o grande tesouro do amor divino. “Que possui o rico, se não tem caridade? E se o pobre tem caridade, o que não possui?”, diz Santo Agostinho. Quem possui todas as riquezas, mas não possui a Deus, é o mais pobre do mundo. Mas o pobre que possui a Deus possui tudo... E quem é que possui a Deus? Aquele que o ama. “Quem, permanece na caridade, em Deus permanece, e Deus nele” (I Jo 4,16).


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sexta-feira, 13 de setembro de 2013

Angústias da alma descuidada na hora da morte.

Cor durum male habebit in novissimo; et qui amat periculum, in illo peribit —”O coração endurecido será oprimido de males no fim da vida; e quem ama o perigo perecerá nele” (Ecclus. 3, 27).

Sumário. Ai do que resiste durante a vida aos convites de Deus! Desgraçado do que cai no leito com a alma em pecado e dali passa à eternidade! O anúncio da morte já próxima, o pensamento de ter de deixar o mundo, as tentações do demônio, os remorsos da consciência, o tempo que já falta, o rigor da justiça divina e mil outras coisas produzirão uma perturbação tão horrível, que pela confusão do espírito a conversão será quase impossível. Meu irmão, para não morreres de morte tão triste, teme agora viver vida pecaminosa!

I. Presentemente os pecadores afastam a lembrança e o pensamento da morte e assim procuram a paz na vida pecaminosa que levam, muito embora nunca a hajam de encontrar. Quando, porém, estiverem nas angústias da morte, próximos a entrar na eternidade: “ao sobrevir-lhes a angústia, buscarão a paz, e não haverá paz” — angustia superveniente, requirent pacem, et non erit (1). Então não poderão escapar aos tormentos de sua má consciência. Procurarão a paz; mas que paz poderá encontrar uma alma, vendo-se carregada de pecados, que, como outras tantas víboras, a mordem por toda a parte? Que paz, em pensar que dentro de poucos instantes deve comparecer perante o Juiz, Jesus Cristo, cujas leis e amizade desprezou até então!

Conturbatio super conturbationem veniet (2) — “A um susto sucederá outro susto”. O anúncio já recebido da morte próxima, o pensamento de se dever separar de todas as coisas do mundo, as tentações do demônio, os remorsos da consciência, o tempo perdido, o tempo que falta, o rigor do juízo divino, a eternidade desgraçada reservada aos pecadores, todas estas coisas produzirão uma perturbação terrível, que lançará a confusão no espírito e aumentará a desconfiança. E é neste estado de confusão e de desconfiança que o moribundo passará à outra vida. — Com efeito, a experiência ensina que as almas desleixadas na hora da morte nem sabem responder às perguntas que o sacerdote faz, e se confundem. Assim muitas vezes o confessor lhes dá a absolvição, já não porque as julga bem dispostas, mas porque não há mais tempo a perder.

Se alguma vez se têm visto pecadores moribundos chorarem, fazerem promessas e pedir perdão a Deus, diz com razão um autor que, geralmente falando, tais promessas, lágrimas e orações são como as de um homem atacado pelo seu inimigo, que lhe põe o punhal sobre o coração e o ameaça de morte. — Desgraçado, pois, do que em vida se endurece e resiste aos apelos de Deus; desgraçado do que cai no leito com pecado mortal na alma e dali passa à eternidade!

II. Meu irmão, se porventura tu também és uma daquelas almas que têm a consciência desmazelada, procura quanto antes remediar tão grave mal. Para não morreres má morte, teme viver má vida. Quem te dá a certeza de que não morrerás fulminado por um raio, de uma sufocação, de um ataque de apoplexia? E ainda que na morte tivesses tempo para te converter, quem te garante que deveras te converterás e farás uma boa confissão? Oh, quantos daqueles que se iludiram com a ideia de se converterem na hora da morte estão agora ardendo no inferno!

Ó chagas de meu Jesus, vós sois minha esperança. Desperaria do perdão de meus pecados e da minha salvação eterna se não erguesse os olhos para vós, fontes de misericórdia e de graça, pelas quais um Deus derramou todo o seu sangue, para lavar a minha alma de tantas faltas cometidas. Adoro-vos, ó chagas sagradas e em vós confio. Detesto mil vezes e amaldiçoo os prazeres indignos pelos quais causei desgosto a meu Redentor e perdi miseravelmente a sua amizade. Olhando para vós, avivam-se as minhas esperanças e para vós dirijo os meus afetos.

Meu amado Jesus, mereceis que todos os homens Vos amem, e Vos amem de todo o coração; e eu Vos ofendi tanto e tanto desprezei o vosso amor. Não obstante isso, Vós me tendes suportado e com tão grande piedade convidado ao perdão. Ah, meu Salvador, não permitais que Vos ofenda outra vez e que me condene. Que tormento seria para mim no inferno a vista de vosso sangue e de tantas misericórdias que me fizestes! Amo-Vos e sempre quero amar-Vos. Dai-me a santa perseverança. Desprendei o meu coração de todo o amor que não seja para Vós e inspirai-me um verdadeiro desejo e a resolução de não amar de hoje em diante senão a Vós, ó meu soberano Bem! — Ó Maria, minha Mãe, atraí-me para Deus e fazei que eu seja todo d´Ele antes de morrer.

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1. Ez 7, 25.
2. Ez 7, 26.

(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo III: Desde a Décima Segunda Semana depois de Pentecostes até o fim do ano eclesiástico. Friburgo: Herder & Cia, 1922, p. 27-30.)
 
 
Fonte: http://www.saopiov.org/2013/08/angustias-da-alma-descuidada-na-hora-da.html#ixzz2buXOhu1t

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segunda-feira, 9 de setembro de 2013

Os devotos inconstantes

Os devotos inconstantes são aqueles que praticam alguma devoção à Santíssima Virgem a intervalos e por capricho: ora são fervorosos, ora tíbios; ora parecem dispostos a fazer tudo para servir Nossa Senhora, ora, e pouco depois, já não parecem os mesmos. A princípio abraçarão todas as devoções à Santíssima Virgem, entrarão em suas confrarias, mas logo depois já não praticarão as regras com fidelidade. Mudam como a Lua (Eclo 27, 12), e Maria esmaga-os sob os Seus pés como ao crescente (Ap 12, 1), porque são volúveis e indignos de serem contados entre os servos desta Virgem Fiel. Estes têm a fidelidade e a constância por herança. Mais vale não se sobrecarregar com tantas orações e práticas de devoção, e fazer pouco com amor e fidelidade, a despeito do mundo, do demônio e da carne.

Fonte: São Luís Maria Grignion de Monfort. Tratado da Verdadeira Devoção à Santíssima Virgem. Editora Vozes.  Petrópolis, 19ª edição. 1992.




Visto em: http://apostoladocatolicovirtual.blogspot.com.br/2012/12/os-devotos-inconstantes.html

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domingo, 8 de setembro de 2013

Natividade da Virgem Maria

domingo, 8 de setembro de 2013


Festa da Natividade de Nossa Senhora desde muito cedo que foi celebrada no Oriente, e muitos textos dos Padres o atestam; este, que traduzimos, foi pronunciado em Jerusalém, na Igreja situada sobre o local da Piscina Probática, onde Jesus tinha curado o paralítico, e onde a tradição – atestada por alguns apócrifos – situava a casa de Joaquim e de Ana, o que vem a explicar certas alusões feitas ao longo do texto.

É um grande texto panegírico da glória de Maria, por dela ter nascido o Salvador, com expressões que chegam a parecer ter sido produzidas em estado de êxtase. Usando dados do Antigo Testamento, dos Evangelhos e das Cartas, da tradição oral, de outros teólogos e da própria liturgia bizantina, o nosso Doutor passa em revista a importância para a salvação e para a Igreja do nascimento de Maria, louvando «en passant» os seus pais, Joaquim e Ana. Um ponto muito importante: chama e afirma – é dos primeiros a fazê-lo - Imaculada a Maria.

Sem deixar de fazer também todo o desfiar das tipologias de Maria presentes no Antigo Testamento, S. João Damasceno consegue louvar Nossa Senhora como poucos o fizeram, fornecendo a base patrística para muitas das afirmações acerca de Maria e do seu lugar no mistério da Redenção do homem que mais tarde vieram a efetuar-se. A sua influência na Idade Média foi enorme, e pode mesmo dizer-se que a intuição de base do Dogma da Assunção Corporal de Nossa Senhora ao céu está já presente na obra do Damasceno.

«Do humilde monge e presbítero João Damasceno, Homilia para o nascimento de Nossa Senhora Santíssima, a Mãe de Deus e sempre Virgem Maria».



Natividade de Maria
Antonio Zanchi - 1671
Santuario della Natività di S. Maria em Sombreno - Itália
1. Vinde, todas as nações, vinde, homens de todas as raças, línguas e idades, de todas as condições: com alegria celebremos a natividade da alegria do mundo inteiro! Se os gregos destacavam com todo o tipo de honras – com os dons que cada um podia oferecer – o aniversário das divindades, impostos aos espíritos por mitos mentirosos que obscureciam a verdade, e também o dos reis, mesmo se eles fossem o flagelo de toda a existência, que deveríamos nós fazer para honrar o aniversário da Mãe de Deus, por quem toda a raça mortal foi transformada, por quem o castigo de Eva, nossa primeira mãe, foi mudada em alegria? Com efeito, uma ouviu a sentença divina: «Darás à luz no meio de penas»; a outra ouviu, por seu turno: «Alegra-te, oh Cheia de Graça». À primeira disse-se: «Inclinar-te-ás para o teu marido», mas à segunda: «O Senhor está contigo». Que homenagem ofereceremos então nós à Mãe do Verbo, senão outra palavra? Que a criação inteira se alegre e festeje, e cante a natividade de uma santa mulher, porque ela gerou para o mundo um tesouro imperecível de bondade, e porque por ela o Criador mudou toda a natureza num estado melhor, pela mediação da humanidade. Porque se o homem, que ocupa o meio entre o espírito e a matéria, é o laço de toda a criação, visível e invisível, o Verbo criador de Deus, ao se unir à natureza humana, uniu-se através dela a toda a criação. Festejemos assim o desaparecimento da humana esterilidade, pois cessou para nós a enfermidade que nos impedia a posse dos bens.

2. Mas porque nasceu a Virgem Maria de uma mulher estéril? Àquele que é o único verdadeiramente novo debaixo do sol, como coroamento das Suas maravilhas, deviam ser preparados os caminhos por maravilhas, para que lentamente as realidades mais baixas se elevassem de modo a serem as mais altas. E eis uma outra razão, mais alta e mais divina: a natureza cedeu o lugar à graça, pois ao vê-la tremeu, e não quis mais ter o primeiro lugar. Como a Virgem Mãe de Deus devia nascer de Ana, a natureza não ousou prevenir o fruto da graça, mas permaneceu ela própria sem fruto, até que a graça trouxesse o seu. Era necessário que fosse primogênita aquela que deveria gerar «o Primogênito de toda a criação, no Qual tudo subsiste». Oh Joaquim e Ana, casal venturoso! Toda a criação está em dívida para convosco, porque através de vós ela pôde oferecer ao Criador o dom – entre todos o mais excelso – de uma Mãe venerável, a única digna d’Aquele que a criou. Ditosos os rins de Joaquim, de onde saiu uma semente totalmente imaculada, e admirável o seio de Ana, graças ao qual se desenvolveu lentamente, onde se formou e de onde nasceu uma tão santa criança! Oh entranhas que levastes um céu vivo, mais vasto que a imensidade dos céus! Oh moinho onde foi amassado o Pão vivificante, segundo as próprias palavras de Cristo: «Se o grão de trigo não cair na terra e morrer, ficará só». Oh seio que aleitaste aquela que alimentou o Aquele que alimenta o mundo! Maravilha das maravilhas, paradoxo dos paradoxos! Sim, a inexprimível Encarnação de Deus, cheia de condescendência, devia ser precedida por estas maravilhas. Mas como prosseguirei? O meu espírito está fora de si, dividido que estou entre o temor e o amor; o meu coração bate e a minha língua move-se: não posso suportar a alegria, as maravilhas deitam-me por terra, o ardor apaixonado aprisionou-me num arrebatamento divino. Que o amor vença, que o temor desapareça e que cante a cítara do Espírito: «Alegrem-se os céus, exulte a terra»!

3. Hoje as portas da esterilidade abrem-se, e uma porta virginal e divina avança: a partir dela, por ela, o Deus que está acima de todos os seres deve «vir ao mundo» «corporalmente», segundo a expressão de Paulo, ouvinte dos segredos inefáveis. Hoje, da raiz de Jessé saiu uma vergôntea, de onde surgirá para o mundo uma flor substancialmente unida à divindade.

Hoje, a partir da natureza terrena, um céu foi formado sobre a terra por Aquele que outrora o tornara sólido separando-o das águas, elevando o firmamento nas alturas. É um céu verdadeiramente mais divino e mais elevado que o primeiro, porque Aquele que no primeiro céu criara o sol Se elevou a Si próprio neste novo como um sol de justiça. Sim, há n’Ele duas Naturezas, apesar da loucura dos Acéfalos, e uma só Pessoa, mesmo que os Nestorianos se encolerizem! A Luz eterna, proveniente da Luz eterna antes de todos os séculos, o Ser, imaterial e incorpóreo, tomou um corpo desta mulher, e como um esposo que sai para fora de seu tálamo, assim fez Deus, tornando-se como tal filho da raça terrena. Como um gigante Ele alegra-Se de percorrer os caminhos da nossa natureza, de Se encaminhar, pelos Seus sofrimentos, para a morte, de atar o homem forte e lhe arrancar os seus bens, isto é, a nossa natureza, e de reunir na terra celeste a ovelha errante.

Hoje, o «Filho do Carpinteiro», O Verbo universalmente ativo d’Aquele que tudo construiu por Ele, o Braço Poderoso do Deus Altíssimo, querendo afiar pelo Espírito - que é como o seu dedo – a lâmina embotada da natureza, construiu para Si uma escada viva, cuja base está firmada na terra, com o cimo a tocar os céus: Deus repousa sobre ela. É dela a figura que Jacob contemplou, e por ela Deus desceu da Sua imobilidade, ou melhor, inclinou-Se com condescendência, tornando-Se assim «visível sobre a terra, e conversando com os homens». Estes símbolos representam a Sua vinda ao meio de nós, o seu abaixamento condescendente, a sua existência terrena, o verdadeiro conhecimento d’Ele próprio, dado a todos aqueles que estão sobre a terra. A escada espiritual, a Virgem, está fixa na terra, pois na terra ela tem a sua origem, mas a sua cabeça eleva-se até ao céu. A cabeça de toda a mulher é o homem, mas para ela, que não conheceu homem, Deus Pai ocupa o lugar de sua cabeça: pelo Espírito Santo, Ele concluiu uma aliança e, como semente divina e espiritual, enviou o Seu Filho e Verbo, força omnipotente. Em virtude do beneplácito do Pai, não é por uma união natural, mas é superando as leis da natureza, pelo Espírito Santo e pela Virgem Maria, que o Verbo Se fez carne e habitou entre nós. É por aqui que se vê que a união de Deus com os homens se cumpre pelo Espírito Santo.

«Quem puder entender, que entenda»; «Quem tem ouvidos para ouvir, que ouça». Descartemos as representações corporais: a divindade jamais sofreu mudança, oh homens! Aquele que sem alteração gerou Seu Filho a primeira vez segundo a natureza, sem alteração O gera agora de novo segundo a economia. Disto é testemunha a palavra de David, antepassado de Deus: «O Senhor disse-me: "Tu és Meu Filho, Eu hoje te gerei"». Ora este «hoje» não tem cabimento na geração antes de todos os séculos, pois esta deu-se fora do tempo.

4. Hoje é edificada a Porta do Oriente, que dará a Cristo «entrada e saída», e «essa porta estará fechada». Nela está Cristo, «a Porta das Ovelhas», e «o Seu nome é Oriente»: por Ele obtivemos acesso ao Pai das Luzes. Hoje sopraram as brisas anunciadoras duma alegria universal. Alegre-se o céu nas alturas, que debaixo dele «exulte a terra», que os mares do mundo bramam, porque no mundo acaba de ser concebida uma concha, a qual pelo clarão celeste da divindade conceberá em seu seio, gerando a pérola inestimável, Cristo. Dela sairá o «Rei da Glória», revestido da púrpura de sua carne, para «visitar os cativos», e «proclamar a libertação». Que a natureza transborde de alegria: a cordeirinha vem ao mundo, graças à qual o Pastor revestirá a ovelha, tirando-lhe as túnicas da antiga mortalidade. Que a virgindade forme os seus coros de dança, pois nasceu a Virgem que, segundo Isaías, «conceberá e dará à luz um filho, que será chamado Emmanuel, o que quer dizer "Deus conosco"». Aprendei, oh Nestorianos, e fugi à vossa derrota: «Deus conosco»! Não é nem só um homem, nem um mensageiro, mas o Senhor em Pessoa que virá e nos salvará.

«Bendito o que vem em nome do Senhor», «o Senhor é Deus, e iluminou-nos»; «Celebremos uma festa» para o nascimento da Mãe de Deus. Rejubila, Ana, «estéril que não davas à luz; ri de alegria e de júbilo, tu que não tiveste as dores de parto»! Rejubila, Joaquim: de tua filha «um menino nos nasceu, um filho nos foi dado (...) e ser-lhe-á dado este nome: Anjo do grande Conselho (quer dizer, Salvação do Universo) Deus Forte». Que Nestório fique vermelho e meta a mão sobre a boca. A criança é Deus; portanto, como não seria ela a Mãe de Deus, ela que O colocou no mundo? «Se alguém não reconhece por Mãe de Deus a Santa Virgem, está separado da divindade». A frase não é minha, mas no entanto pertence-me: recebi-a como precioso tesouro e herança teológica do meu pai Gregório, o Teólogo.

5. Oh Joaquim e Ana, casal bem-aventurado e verdadeiramente sem mancha! Pelo fruto do vosso seio fostes reconhecidos, segundo a palavra do Senhor: «Pelos seus frutos os reconhecereis». A vossa conduta foi agradável a Deus e digna daquela que nasceu de vós. Tendo levado uma vida casta e santa, engendrastes a jóia da virgindade, aquela que deveria permanecer Virgem antes, durante e depois do parto, a única sempre Virgem de espírito, de alma e de corpo. Convinha, de fato, que a virgindade saída da castidade produzisse a Luz única e monógena, corporalmente, pela benevolência d’Aquele que A gerou sem corpo – o Ser que não gera, mas que é eternamente gerado, para Quem ser gerado é a única qualidade própria da Sua Pessoa. Oh que maravilhas, e que alianças estão neste menino! Oh Filha da esterilidade, virgindade que engravida, nela se unirão divindade e humanidade, sofrimento e impassibilidade, vida e morte, para que em todas as coisas o menos perfeito seja vencido pelo melhor! E tudo isto para minha salvação, oh Mestre! Amas-me tanto que não realizaste esta salvação nem pelos anjos, nem por nenhuma outra criatura, mas tal como já a minha criação, também a minha regeneração foi Tua obra pessoal. Assim, eu exulto, faço despertar a minha alegria e o meu júbilo, volto à fonte das maravilhas, e embriagado de uma torrente de alegria, toco de novo a cítara do espírito e canto o hino divino da natividade.

6. Oh Joaquim e Ana, casal castíssimo, «par de rolas» no sentido místico! Observando a lei da natureza, a castidade, merecestes os dons que ultrapassam a natureza: gerastes no mundo uma Mãe de Deus sem esposo. Depois de uma existência santa e piedosa numa natureza humana, gerastes uma filha superior aos anjos e que agora reina sobre eles. Oh Filha graciosíssima e dulcíssima, oh lírio nascido entre os espinhos, da descendência nobilíssima e real de David! Por ti a realeza encheu-se com o sacerdócio; por ti foi cumprida «a mudança da Lei», e revelado o espírito escondido sob a letra, pois que a dignidade sacerdotal passou da tribo de Levi à de David. Oh Rosa nascida dos espinhos do judaísmo, que enche o universo de um perfume divino! Oh filha de Adão e Mãe de Deus! Ditosos os rins e o seio de onde surgistes! Ditosos os braços que te levaram, os lábios que experimentaram os teus castos beijos, os lábios de teus pais, para que em tudo tu fosses eternamente virgem. Hoje é para o mundo o início da salvação. «Aclamai o Senhor, terra inteira, cantai, exultai, tocai instrumentos». Elevai a vossa voz, «fazei-a escutar sem temor», porque na Santa Probática nos nasceu uma Mãe de Deus, de quem quis nascer o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo.

Tremei de alegria, oh montanhas, naturezas racionais, voltadas para o cume da contemplação espiritual: a montanha do Senhor, refulgente, vem ao mundo, ultrapassando todas as montanhas e todas as colinas, isto é, os anjos e os homens; dela, sem intervenção da mão do homem, Cristo quis desprender-Se, Ele que é a Pedra Angular, Pessoa Una, que aproxima em Si aquilo que está distante: a divindade e a humanidade, os anjos e os homens, os gentios e o Israel carnal num só Israel espiritual. «Montanha de Deus, montanha de abundância, montanha que Deus escolheu para Seu repouso. Os carros de Deus vêm aos milhares, com seres refulgentes» da graça divina, querubins e serafins. Oh cume mais santo que o Sinai, não coberto nem por fumo, nem por trevas, nem por tempestades, nem sequer por fogo perecível, mas pelo esplendor que ilumina do Santíssimo Espírito. No Sinai, o Verbo de Deus tinha gravado a Lei sobre tábuas de pedra, pelo Espírito, dedo divino; aqui, pela ação do Espírito Santo e pelo sangue de Maria, o próprio Verbo encarnou, dando-se á nossa natureza como um remédio de salvação mais eficaz. Antes, era o maná; aqui, está Aquele que deu o maná e a sua doçura.

Que a morada célebre que Moisés construiu no deserto com matérias preciosas de todo o tipo, e ainda antes dela a morada do nosso pai Abraão, se apaguem diante da morada de Deus, viva e espiritual. Ela foi o repouso, não só da energia divina, mas da Pessoa do Filho, que é Deus, presente substancialmente. Que a arca recoberta de ouro reconheça que não tem nada de comparável com Maria, e da mesma forma a urna de ouro com o maná, o candelabro, a mesa e todos os objetos do culto antigo: eles foram honrados porque todos a prefiguravam, como sombras do verdadeiro protótipo.

7. Hoje, o Criador de todas as coisas, Deus Verbo, fez um livro novo, saído do coração do Pai para ser escrito, como se fosse por uma cana, pelo Espírito, que é a língua de Deus. Esse livro foi dado a um homem que conhecia as letras, mas que não o lia. José, com efeito, não conheceu Maria, nem a significação do mistério em si. Oh filha toda santa de Joaquim e de Ana, que escapaste aos olhares dos Principados e das Potestades e aos «assédios inflamados do maligno», e que viveste no tálamo do Espírito, para seres guardada intacta e te tornares esposa de Deus e Mãe de Deus por natureza! Oh filha toda santa, que apareceste nos braços de tua mãe, tu és o terror das potências de rebelião! Oh filha toda santa, alimentada do leite maternal, e rodeada das legiões angélicas! Oh filha amada de Deus, honra de teus pais, gerações de gerações te proclamam bem aventurada, como tu própria o afirmaste com verdade! Oh filha digna de Deus, beleza da natureza humana, reabilitação de Eva, nossa primeira mãe! Por teu nascimento, aquela que tombara foi redimida. Oh filha toda santa, esplendor do sexo feminino! Se a primeira Eva, com efeito, foi culpada de transgressão, e se por sua causa «a morte fez a sua entrada no mundo» (porque ela se colocou ao serviço da serpente contra o nosso primeiro pai), Maria, que se fez a serva da vontade divina, enganou a serpente enganadora e introduziu no mundo a imortalidade.

Oh filha sempre Virgem, que pode conceber sem intervenção humana, porque Aquele que concebeste tem um Pai Eterno! Oh filha da raça terrena, que levas em teus braços divinamente maternais o Criador! Os séculos rivalizavam entre si para saber qual deles se honraria de te ver nascer, mas o desígnio fixado antecipadamente de Deus, «que fez os séculos» colocou fim a essa rivalidade, e os últimos tornaram-se os primeiros, eles a quem foi atribuída a felicidade da tua Natividade. Na verdade, tu és mais preciosa que toda a criação, pois só de ti o Criador recebeu em partilha as primícias da nossa matéria humana. A Sua Carne foi feita da tua carne, o Seu Sangue do teu sangue; Deus alimentou-Se do teu leite, e os teus lábios tocaram os lábios de Deus. Oh maravilhas incompreensíveis e inefáveis! Na presciência da tua dignidade, amou-te o Deus do universo; porque te amou, predestinou-te, e nos «últimos tempos», chamou-te à existência, e constituiu-te Mãe para gerar um Deus e alimentar o Seu próprio Filho e Verbo.

8. Diz-se que os contrários servem de remédio contra os contrários, mas os contrários não nascem uns dos outros. Mesmo se cada ser é na sua natureza um tecido de contrários, ele próprio provém da predominância da causa que o fez nascer. De fato, da mesma forma que o pecado, ao operar para mim a morte por meio do bem, mostra em extremo a sua natureza pecaminosa, da mesma forma o Autor dos bens, pelo meio dos contrários desses bens, opera para nós o bem que Lhe é natural, porque «onde abundou o pecado, superabundou a graça». Se tivéssemos conservado a nossa primeira comunidade com Deus, não teríamos merecido a Segunda, maior e mais extraordinária. De fato, pelo pecado, fomos julgados indignos da primeira união, porque não conservamos o dom recebido. Mas pela compaixão de Deus fomos perdoados e tomados sob a Sua guarda, para que a comunhão fosse assegurada, porque nos quer conservar unidos a Ele, sem nenhuma beliscadura, Aquele que nos recebeu sob a Sua proteção.

Sim, toda a terra pejava de fornicações, e o povo do Senhor, possuído «pelo espírito de fornicação», errava longe do Senhor seu Deus, longe d’Aquele que o tinha adquirido «com mão forte e braço poderoso», que com sinais e prodígios o tinha feito sair da «casa da escravidão» do Faraó, o tinha conduzido através do Mar Vermelho e guiado «por uma nuvem de dia, e noite inteira por um luzeiro de fogo». O seu coração voltava-se para o Egito, e o povo do Senhor tornou-se «aquele que não é o povo do Senhor»; aquele que obtinha misericórdia, tornou-se aquele que não a merecia, e aquele que era amado, tornou-se aquele que não era amado.

Eis então a razão pela qual uma Virgem vem agora ao mundo, como adversária da ancestral fornicação; ela foi dada como esposa ao próprio Deus, e gerou a misericórdia de Deus. Assim foi estabelecido como povo de Deus aquele que até aí não era o Seu povo; excluído da Sua misericórdia, obteve misericórdia; não amado, é agora amado. Dela nasce o Filho Bem-Amado de Deus, no Qual Ele colocou as Suas complacências.

9. «Uma vinha de belos sarmentos» foi gerada no seio de Ana, e ela produziu um fruto cheio de doçura, fonte de um néctar abundante de vida eterna para os habitantes da terra. Joaquim e Ana fizeram-se semeadores de justiça, e recolheram um fruto de vida. Eles foram iluminados pela luz do conhecimento, procuraram o Senhor, e daí lhes veio um fruto de justiça. Que a terra tenha confiança! «Filhos de Sião, alegrai-vos no Senhor vosso Deus, porque o deserto ficou verdejante»: aquela que era estéril deu o seu fruto; Joaquim e Ana, como montanhas místicas, fizeram brotar vinho doce. Permanece na alegria, oh Ana venturosa, por teres dado à luz uma mulher, porque essa mulher será a Mãe de Deus, porta da luz, fonte de vida, e reduzirá nada a acusação que pesava sobre a mulher.

Os homens nobres do povo desejarão vê-la, e diante dessa mulher os reis das nações prostrar-se-ão, oferecendo-lhe presentes. Entrega-la-ás a Deus, rei universal, adornada da beleza das suas virtudes como de «brocados de ouro», ornada da graça do Espírito, de cuja glória ela se reveste. A glória da mulher é o homem, e é-lhe dada a partir de fora; mas a glória da Mãe de Deus é interior, e é fruto do seu seio.

Oh mulher amabilíssima, três vezes bem-aventurada! «Bendita és tu entre as mulheres, e bendito o fruto do teu ventre»! Oh mulher, filha do Rei David e Mãe de Deus, Rei do Universo! Oh divina e vivente obra-prima, na qual Deus Criador Se alegrou, de quem o espírito é governado por Deus e atento somente a Ele, e de quem todo o desejo se eleva apenas Àquele que é o único amável e desejável, que não te encolerizas senão contra o pecado e contra aquele que o fez nascer! Terás uma vida superior à natureza, porque não é para ti que a terás, já que também não é para ti que tu nasceste. Terás antes a tua vida para Deus, e é por causa d’Ele que vieste à vida, por causa de Quem servirás à salvação universal, para que o antigo desígnio de Deus, a Encarnação do Verbo e a nossa divinização, se cumpra através de ti. A tua vontade é alimentares-te das palavras divinas e fortificares-te com a sua seiva, como «oliveira fecunda na casa de Deus», como «árvore plantada à beira das águas» do Espírito, como árvore da vida, que deu o seu fruto no tempo que lhe foi destinado: o fruto que é o Deus Encarnado, Vida eterna de todos os seres. Guardas todos os pensamento gostoso e útil para a alma, mas todo aquele que é supérfluo e que seria um perigo para a alma tu o rejeitas ainda antes de o provar. Os teus olhos «estão sempre voltados para o Senhor», olhando a luz eterna e inacessível. Teus ouvidos escutam a palavra de Deus e deleitam-se com a cítara do Espírito; foi por eles que o Verbo entrou para Se fazer Carne. Tuas narinas respiram deliciadas o aroma dos perfumes do Esposo, que é Ele próprio um perfume, espontaneamente derramado para perfumar a Sua humanidade: «O teu nome é um perfume que se espalha», diz a Escritura. Os teus lábios louvam o Senhor, e estão ligados aos Seus lábios. A tua língua e o teu palato discernem as palavras de Deus e saciam-se com a suavidade divina. Oh coração puro e sem mácula, que vê e deseja o Deus imaculado!

É neste seio que o Ser ilimitado veio habitar; do seu leite se alimentou Deus, o Menino Jesus. Oh porta de Deus, sempre virginal! Eis as mãos que suportam Deus, e esses joelhos que são um trono mais elevado que os querubins: por eles «as mãos fracas e os joelhos trêmulos» foram fortalecidos. Os seus pés são guiados pela lei de Deus como por uma lâmpada que brilha, e correm após Ele sem se voltarem, até que tenham feito chegar aquela que ama junto do Bem-Amado. Em todo o seu ser ela é o tálamo do Espírito, a Cidade de Deus Vivo, que «alegra os canais do rio», isto é, as correntes dos carismas do Espírito: «Toda bela, toda próxima de Deus». Dominando os querubins, mais alta que os serafins, próxima de Deus: é a ela que esta palavra se aplica!

10. Oh maravilha que ultrapassa todas as maravilhas: uma mulher é colocada mais alto que os serafins, porque Deus surgiu abaixado «um pouco inferior aos anjos»! Que o sapientíssimo Salomão se cale, e não torne a dizer: «Nada de novo debaixo do sol». Oh Virgem cheia da graça divina, templo santo de Deus, que o Salomão espiritual, o Príncipe da Paz, construiu e habita, o ouro e as pedrarias não te dão mais beleza, mas mais que o ouro, é o Espírito que te dá o teu esplendor. Por pedrarias, tens a pérola preciosíssima, Cristo, a Brasa da divindade. Suplica-Lhe que toque os nossos lábios, para que, purificados, Lhe cantemos, com o Pai e o Espírito, a natureza única da Divindade em três Pessoas: «Santo, Santo, Santo, Senhor Deus dos Exércitos».

Santo é o Pai, que quis que em ti e por ti se cumprisse o mistério que predeterminara antes de todos os séculos. Santo é o Forte, o Filho de Deus, e Deus Monógeno, que hoje te faz nascer, primogênita de uma mãe estéril, para que, sendo Ele próprio Filho Único do Pai e «Primogênito de toda a criatura», possa nascer de ti, como Filho único de uma Virgem-Mãe, «Primogênito de uma multidão de irmãos», semelhante a nós e por ti participante da nossa carne e do nosso sangue. Apesar disso, não te fez nascer de um só pai ou de uma só mãe, para que ao único Monógeno fosse reservado em perfeição o privilégio de Filho Único: Ele é, com efeito, Filho Único, somente Ele de um Pai só, somente Ele de uma Mãe só.

Santo é o Imortal, o Espírito de toda a santidade, que pelo orvalho da Sua Divindade te guardou intocada pelo fogo divino: é isto que significou antecipadamente a sarça ardente.

Eu te saúdo, oh Porta das Ovelhas, morada santíssima da Mãe de Deus. Eu te saúdo, oh Porta da Ovelhas, domicílio ancestral da tua rainha, antigamente redil das ovelhas de Joaquim, mas hoje tornada Igreja do rebanho espiritual de Cristo e imitação do céu. Outrora recebias uma vez por ano um anjo de Deus, que agitava as águas e devolvia a saúde a um só homem, livrando-o do mal que o paralisava; agora recebes multidões de potências celestes que celebram conosco a Mãe de Deus, Abismo de Maravilhas, fonte da cura universal. Tu recebeste, não um anjo servidor, mas o «Anjo do Grande Conselho», descido sem ruído algum sobre o velo de lã como uma chuva de bondade, Aquele que renovou toda a natureza, doente e a ponto de se perder, com uma saúde inalterável e uma vida sem velhice: por Ele, o paralítico que em ti jazia saltou como um veado. Eu te saúdo, oh preciosa Porta das Ovelhas, e que se multiplique a tua graça!

Eu te saúdo, Maria, filha dulcíssima de Ana. De novo para ti o amor me impele. Como descrever o teu caminhar cheio de seriedade, os teus vestidos, a graça de teu rosto, a maturidade do discernimento num corpo juvenil? A tua forma de estar foi modesta, distante de todo o luxo e de toda a indolência; o teu caminhar era grave, sem precipitação, sem preguiça; o teu caráter era sério, temperado de júbilo, de uma perfeita reserva a propósito dos homens – disto é testemunho a inquietação que te surgiu aquando da proposta inesperada do anjo. A teus pais dócil e obediente, tinhas humildes sentimentos nas mais altas contemplações, palavra amável, provinda de uma alma pacífica. Em resumo: que outra digna morada senão tu para Deus? Com razão todas as gerações te proclamam bem-aventurada, oh glória insigne da humanidade! Tu és a honra do sacerdócio, a esperança dos cristãos, a planta fecunda da virgindade, porque é através de ti que o renome da virgindade se estendeu aos confins do mundo. «Bendita és tu entre as mulheres, e bendito o Fruto do teu ventre». Aqueles que confessam a tua maternidade divina são benditos, e malditos aqueles que a negam.

12. Joaquim e Ana, casal abençoado, recebei de mim estas palavras de aniversário. Oh filha de Joaquim e de Ana, oh Soberana, acolhe a palavra deste teu servo pecador, mas inflamada pelo amor, e para quem tu és a única esperança de alegria, a protetora da vida e, junto de teu Filho, a reconciliadora e firme garantia da salvação. Possa tu aliviar-me do fardo dos meus pecados, dissipar a névoa que obscurece o meu espírito e o peso que me agarra à matéria. Possas tu deter as tentações, governar felizmente a minha vida e conduzir-me pela mão até à felicidade do Alto. Concede ao mundo a paz, e a todos os habitantes ortodoxos desta cidade uma alegria perfeita e a salvação eterna, pelas orações de teus pais e de todo o Corpo da Igreja. Assim seja, assim seja! «Salve, oh cheia de graça, o Senhor está contigo! Bendita és tu entre as mulheres, e bendito o fruto de teu ventre», Jesus Cristo, o Filho de Deus. A Ele a Glória, com o Pai e o Espírito Santo, pelos séculos dos séculos. Amém.

Tradução: Seminário de Sintra (Portugal)

 
Visto em: http://vashonorabile.blogspot.com.br/2013/09/homilia-sobre-natividade-de-maria.html

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sexta-feira, 6 de setembro de 2013

O grande segredo para viver bem

In omnibus operibus tuis memorare novissima tua, et in aeternum non peccabis – "Em todas as tuas obras lembra-te de teus novíssimos e nunca, jamais pecarás" (Ecclus. 7, 40).

Sumário. Meu irmão, se queres viver bem, procura pensar sempre na morte. Ao veres um túmulo, ao assistires às exéquias de um parente ou amigo, ao veres um cadáver sendo levado à sepultura, contempla nisso a tua própria imagem e dize: Dentro de breves anos, talvez meses ou dias, será tal a sorte de meu corpo e, estando então perdida a alma, estará perdida para sempre. Por terem pensado na morte, quantos deixaram a morte e subiram à mais alta perfeição.

I. Meu irmão, se queres viver bem, procura, durante o tempo de vida que te resta, viver pensando sempre na morte. Ao veres um túmulo, ao assistires às exéquias de um amigo ou parente, ao veres um cadáver sendo levado à sepultura, contempla nisso a tua própria imagem e o que um dia há de ser de ti. Reflete então e dize contigo: dentro em poucos anos, talvez meses ou dias tudo acabará para mim; meu corpo será apenas podridão e vermes. Estando então perdida a alma, tudo estará perdido para mim e perdido para sempre.

Para vocês, rapazes e moças



Vocês já foram adolescentes um dia e desde então começaram a ver o mundo com novos olhos.


Os novos horizontes da idade adulta

Sua imaginação voava para um novo horizonte: o da idade adulta. Vocês passaram a observar, de um modo diferente, homens e mulheres viverem. Talvez vocês tenham procurado imitá-los. A preocupação com o amor tinha até brotado em seu coração, mas vocês eram ainda muito jovens para ousar falar. As pessoas zombariam de vocês e vocês sabiam disso. Idéias confusas e imaginações loucas talvez lhes tenham passado pela cabeça. A educação familiar e a formação religiosa se esforçavam para estabilizar tudo isso, para dar um espaço, uma posição, um sentido, um objetivo a cada um desses chamados interiores. Mas ao mesmo tempo vocês eram solicitados por um clima social, um estilo de vida, talvez atraídos pela sedução dos meios de comunicação, os cartazes, os folhetos, as palavras, os sons que destilam um vazio sentimental, uma falsa concepção do amor humano, que infelizmente difundem uma concepção materialista e errada do amor humano.

Um empresário fez a seguinte observação:

“Oferecem-nos “fatias de vida” habilmente dispostas e de um poder sugestivo impressionante. As histórias limitam-se freqüentemente à evocação de efêmeras conquistas sentimentais, de desentendimentos conjugais, temperados com cenas escandalosas das mais diversas. Quanto mais a vaidade da mulher é exaltada, mais a fidelidade do marido é colocada à prova. Sendo a vida moral dos cônjuges sem verdadeira consistência, é fácil imaginar que em cada romance há pessoas que sucumbem. E os naufrágios são numerosos, tanto perto das margens quanto em alto mar. Poder-se-ia pensar que isso é normal. Ilusões amorosas, incompreensão dos esposos, fuga de um, desespero do outro, brigas, voltas, casos de histeria, … e tantas outras coisas!”


As quimeras modernas

Rádio, televisão, jornais, internet, revistas; sabemos o que tudo isso sugere.

Saiamos agora do meio familiar. Vocês estavam numa idade em que a imaginação freqüentemente ficava sem rédeas, sem grande consciência do que estava conforme a lei natural e o que não estava. Vocês não tinham nenhuma experiência, mas queriam – e isso era legítimo – saber e compreender o plano de Deus sobre o amor humano. E o que lhes revelavam as ruas, as bancas de jornal, os romances baratos, a propaganda no metrô e no cinema, os outdoors, as leituras, os filmes, as músicas, toda essa sarabanda que os escoltava um pouco por toda parte para incrustar-se melhor em suas imaginações? O que lhes diziam, e dizem hoje mais do que nunca, sem nunca formulá-lo, essas imagens, esses filmes, essas músicas, essas publicidades?

Ora, elas dizem que:

- o amor, em primeiro lugar, é uma ocasião de prazer sentimental.

- o amor, em segundo lugar, é uma ocasião de prazer físico.

O discurso que a sociedade contemporânea oferece a vocês, rapazes e moças, não é somente estúpido e chocante, é simplesmente odioso. A imagem do prazer é de fato evocada por todas as fotos de revista, todos os filmes, onde somente uma silhueta física ocupa a imaginação. Ora, essa silhueta, essa criatura fictícia não tem nem coração, nem caráter, nem pudor. Ela não tem pai nem mãe, nem meio social, nem tradição nacional; ela não tem esposo, nem filhos, ela nunca os terá. Ela não é mais uma mocinha, ela nunca será mãe. Tudo que constrói a dignidade, a nobreza da mulher cristã, foi destruído, arrancado, desenraizado dela, isto é, a virgindade e a fecundidade.

Eis o que o depravado materialismo contemporâneo exibe em milhões de exemplares: uma criatura sem alma.

Como vocês sabem, é um clima tão habitual, tão permanente, que há um grande risco de sucumbir a ele sem se notar, um risco de não mais sentir, ao menos confusamente, que tudo isso é abjeto. Uma aspiração secreta, profunda e pura, até agora protegida pela graça divina, tão viva na alma de vocês quando eram crianças e até mesmo adolescentes, é então lenta e progressivamente imbuída, manchada pela obsessão quotidiana dos olhares, das palavras, das músicas que o cinema, a internet, propagandas e revistas sugerem, fazendo de vocês cúmplices vergonhosos.

Eis aí o cenário no qual vocês crescem hoje em dia. Essa é a concepção diabólica da economia social onde o gosto pela fortuna justifica todos os meios, inclusive os que desonram o amor, rebaixam as almas e destroem os lares. Tudo isso faz com que vocês tenham de enfrentar dificuldades maiores e mais numerosas do que as gerações anteriores. Vocês são inconscientemente moldados por tudo isso. Entretanto, lembramos-lhes algumas verdades cristãs sobre o casamento. Foi no colégio, em casa, ou na Igreja que vocês aprenderam, mas, para muitos, infelizmente, as questões de moral só chegam como proibições, tabus, e freqüentemente só surgem aí afirmações sem sentido, formalistas, convencionais.

E então, sob o aguilhão desse clima social, só há mais um passo a dar antes de afirmar que a moral cristã não é mais adaptada a nosso tempo, que não é prática, que não leva em conta os fatos, que é preciso alinhar-se à moda. Instala-se então a revolta contra tudo o que não segue a correnteza da facilidade, que oferece tantas e diversas solicitações. E sabemos onde essa correnteza pode levar.


Perigosos deslizes

Um deles são certos namoros. Mesmo com uma intenção mais ou menos longínqua de casamento, quantos namoros deixam de seguir, na maioria das vezes, a reta intenção de conhecer para depois comparar, para melhor escolher. O que alguns procuram nessas amizades é uma intimidade sentimental, uma necessidade de afeto que se quer suprir. Ora, isso não merece o nome de amor. De uma parte e de outra, é o egoísmo da sensibilidade que se procura satisfazer, satisfação que degradar-se-á progressivamente.

Esses encontros que acontecem sobretudo no escuro de uma sala de cinema, na atmosfera estressante de uma noitada, ou que continuam até tarde da noite em uma boate, expressam – vocês não negarão – expressam muito mais um desejo lancinante de intimidade física do que uma reserva profunda, nobre, e verdadeira de um rapaz e de uma moça que procuram conhecer-se verdadeiramente para saber, antes de confessar seu amor, se essa afirmação provém de um instinto indiferente ou se nasceu de motivos profundos, sérios e íntimos de suas almas.

Talvez todas essas questões não pareçam tão importantes para vocês que ainda não são casados. Entretanto, às vezes elas surgem de maneira trágica nos meses depois do casamento. Assim que o fogo do desejo é diminuído, são na verdade duas almas que se encontram face a face, dois caráteres, duas atitudes perante a vida … e às vezes, que pena!, dois egoísmos se defrontam. E quando a obnubilação de uma atração exclusivamente sensível é dissipada – e a experiência mostra que essa nuvem se dissipa rapidamente – jovens esposos, jovens esposas, sem ousar dizê-lo, começam a fazer comparações: “Ah, se eu tivesse casado com fulano … ele era menos atraente mas tão mais sólido”; “Se tivesse escolhido beltrana! Ela era menos vaidosa, mais reservada, mas hoje me parece muito mais feminina!”

Não é escutando cegamente nossas paixões que nos preservamos das adversidades. Existe uma armadilha sutil, freqüente, da qual só se escapa com a ajuda do Espírito Santo. É a armadilha de crer que rapazes e moças estão apaixonados na medida em que são irracionais. Não teria a razão nenhum papel a desempenhar no campo dos sentimentos? Há contradição e impossibilidade de conciliar o ponto de vista do coração com o da inteligência? Mesmo sendo a juventude a idade das paixões, ela não pode, por causa disso, viver em constante revolta contra a sabedoria prudente da maturidade. A razão não é inimiga do amor humano. Acompanhar nosso amor de reflexões, de observações, de meditações deliberadas não é enfraquecê-lo ou traí-lo, pelo contrário, é enriquecê-lo. A questão não é somente insuflá-lo com uma inspiração cega e apaixonada; é submetê-lo a uma outra inspiração, razoável e voluntária. É permitir ao amor que, depois do casamento, permaneça intacto, fortifique-se; é alimentar uma chama viva, a mesma que ilumina e aquece o lar.


Pensar antes de agir

A ordem natural das coisas num tal assunto é primeiramente julgar antes de decidir; em segundo lugar, procurar conhecer antes de chegar ao amor. Ora, por uma singular reversão devida à tentação, os jovens têm a tendência de decidir antes de julgar, e de amar antes de conhecer. É bom, é necessário julgar um rapaz, julgar uma jovem antes de decidir desposá-lo(a). É bom e necessário, tanto quanto razoavelmente é possível, conhecer o caráter, as aptidões, os gostos, as qualidades morais daquele ou daquela a quem se pensa unir sua vida, antes de se deixar levar por sonhos e desejos.

É difícil, me dirão! Sim. É doloroso? Sim, isso exige, incontestavelmente, uma renúncia interior. Mais doloroso é enganar-se, unir sua vida a um desconhecido, uma desconhecida, simplesmente porque pensamos que seu sorriso, seu olhar, ou sua situação, sua fortuna ou sua classe social eram promessas suficientes de felicidade.

Assim, existem moças que desposam uma silhueta, um automóvel ou uma situação. Cinco ou dez anos mais tarde, no fundo de seu coração, quando sofrem o egoísmo do marido e todas suas terríveis conseqüências, será que elas pensam que os motivos que determinaram seu casamento já prognosticavam tal infelicidade? Elas não pensaram no perigo que as ameaçava. Pensavam que os homens eram sempre mais ou menos egoístas. Quanto às riquezas, ao físico agradável ou à inteligência, isso nem sempre todos têm…

Existem também rapazes que desposam um sobrenome, um carinho ou uma herança futura, ou até mesmo uma cultura excepcional. E descobrem tarde demais que em outros lares a vida é mais doce, a comida melhor, as crianças mais bem cuidadas, mais educadas, a casa mais limpa, e que todos esses detalhes são exclusivamente o reflexo de um amor mais profundo, de um devotamento mais terno.


Os encontros católicos

É pensando nesses casos que entendemos o papel das relações entre rapazes e moças no seio de uma paróquia, dentro de um movimento católico. A função desses encontros não é esboçar, num plano inconscientemente egoísta, um laço sentimental, para esperar mais confortavelmente a idade ou a hora do casamento. A função desses encontros que vocês têm em grupo, quando saem todos juntos é, antes de tudo, ensinar-lhes a julgar-se reciprocamente. Nessa ocasião, a procura inquieta de uma intimidade sentimental ou de abandonos mais equívocos manchará a alma daqueles que estão na idade em que se decide seu destino.

É preciso que vocês, mais do que nunca, deixem Jesus Cristo viver e agir em suas almas, que devem ser constantemente alimentadas pela oração e pelos sacramentos. É Ele, Jesus Cristo, quem lhes dará a força de permanecer inteiramente reservados para o dom total que supõe um amor total. É Ele quem lhes dará a luz para bem julgar, evitando que a paixão chegue a obnubilá-los.

Tenham esta fé, a fé de que Deus sabe melhor do que vocês o que convém à sua verdadeira felicidade. Isso fará com que vocês evitem substituir a providência dEle pela sua própria vontade, a confiança em vocês próprios à confiança nEle.

É através da graça, usando de uma verdadeira liberdade, que vocês se encontrarão, caso sejam chamados ao matrimônio: é a verdadeira liberdade que os fará evitar encontros cujo objetivo não é conhecer-se nem julgar-se mas somente medir fraquezas e viver aventuras de prazer. Essas aventuras são de tal maneira imprudentes que destroem antecipadamente a felicidade conjugal, porque  só servem para exacerbar o egoísmo de cada um dos futuros cônjuges. Como vocês serão amanhã, espontaneamente, ocasião de aperfeiçoamento mútuo, se hoje, inevitavelmente, são um para o outro, ocasião de queda?



pelo Rev. Pe. Xavier Beauvais



Bibliografia: 
« La joie d’aimer » (Marcel Clement)
« Le combat pour ces jeunes » (Yves Salem)

Fonte: http://www.fsspx.com.br/exe2/para-voces-rapazes-e-mocas
 

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