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sexta-feira, 23 de dezembro de 2016

Meditações sobre a hora da morte.



A morte do justo e a morte do pecador obstinado




“Achando-se Filipe II, rei de Espanha, às portas da morte, mandou vir seu filho à sua presença e, abrindo o manto real com que se cobria, mostrou-lhe o peito já roído de vermes, dizendo: Príncipe, vede como se morre e como se acabam todas as grandezas deste mundo.

Foi  com  razão  que  Teodoreto  disse  que a morte não teme riquezas, nem poder, nem púrpura; e que tanto os vassalos como os príncipes se tornam presa de corrupção. Assim, todo aquele que morre, ainda que seja príncipe, nada leva consigo ao túmulo.

Toda a sua glória acaba no leito mortuário (Sl 48,18).

Refere Santo Antônio que, na morte de Alexandre Magno, exclamara um filósofo: “Aí está quem ontem calcava  a  terra  aos  pés;  hoje  é  pela  terra  oprimido. Ontem cobiçava a terra inteira; hoje basta-lhe um espaço de sete palmos. Ontem dirigia exércitos inumeráveis através do mundo; hoje uns poucos coveiros o levam ao túmulo”.

Mas escutemos, antes de tudo, o que disse o próprio Deus: “Por que se ensoberbece o pó e a cinza?” (Eclo 10,9). “Homem, não vês que és pó  e  cinza,  de  que  te  orgulhas?  Para  que  te  serve consumir teus anos e teu espírito em adquirir grandezas deste mundo? Virá a morte e então se dissiparão todas  essas  grandezas  e  todos  os  teus  projetos” (Sl 145,4).

Quão preferível foi a morte de São Paulo Eremita, que viveu  sessenta  anos  em uma gruta, à de Nero, imperador  de  Roma!

Quanto  mais  feliz  a  morte  de São  Félix,  simples  frade capuchinho,  do  que  a  de Henrique VIII, que passou sua vida entre as pompas reais, mas sendo inimigo de Deus!

É preciso considerar,  porém,  que  os  Santos,  para  alcançar  morte  semelhante, abandonaram tudo: pátria, delícias e quantas esperanças o mundo lhes oferecia, para abraçarem vida pobre e menosprezada. Sepultaram-se  em  vida  sobre  a  terra,  para  não serem sepultados no inferno depois da morte.

Como, porém,  os  mundanos  podem esperar  morte  feliz,  vivendo, como vivem, em pecados, prazeres terrestres e  ocasiões  perigosas? 

Deus  preveniu  os  pecadores que na hora da morte o procurarão e não o hão de achar (Jo 7,34). Disse que então já não será tempo de  misericórdia,  mas  sim  de  justa  vingança  (Dt 21 32,15).

A razão nos ensina esta mesma verdade, porque, na hora da morte, o mundano se achará fraco de espírito, obscurecido e duro decoração pelos maus hábitos que contraiu; as tentações então manifestar-se-ão mais violentas, e ele, que em vida se acostumou a render-se e a deixar-se vencer, como resistirá naquele transe? Seria necessária uma graça extraordinária e poderosa para lhe transformar o coração.

Mas será Deus obrigado a lha conceder? Ou talvez a mereceu pela vida desordenada que levou?

E, no entanto, trata-se nessa ocasião da desdita ou da felicidade eterna.

Como é possível, ao pensar nisto, que aquele que crê nas verdades da fé não renuncie a tudo para entregar-se  inteiramente  a  Deusque  nos  julgará  segundo nossas obras?”




Excerto do livro “Preparação para a morte”
de Santo Afonso Maria de Ligório


Link para download do livro completo: aqui



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