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quarta-feira, 1 de março de 2017

A grande traição: a mentalidade católico-liberal (Parte 1)




O beijo de Judas (Caravaggio)



Reconciliar a Igreja com a Revolução: tal é a empresa dos liberais que se dizem católicos.



Os liberais que se dizem católicos sustentam que a doutrina católica do Reino Social de Nosso Senhor Jesus Cristo e da união da Igreja com o Estado é sem dúvida verdadeira, mas inaplicável mesmo nos países católicos:

·  Na teoria, pode-se aceitar a tese proposta pelos Papas e teólogos.

·  Na prática, deve-se ceder ante as circunstâncias e resolutamente aderir à hipótese: promover o pluralismo religioso e a liberdade de cultos:

Os liberais católicos não têm deixado de sustentar que desejam a ortodoxia tanto quanto os mais intransigentes, e que sua única preocupação são os interesses da Igreja: "a reconciliação que procuram não é teórica nem abstrata, mas somente prática”[1]


É a famosa diferença entre a tese (a doutrina) e a hipótese (prática) conforme as circunstâncias. Notemos que se pode dar uma interpretação correta a esta diferenciação: a aplicação dos princípios deve levar em conta as circunstâncias; isto se faz com ponderação, que é parte da prudência. Daí vem que a presença dentro de uma nação católica de fortes minorias muçulmanas, judias e protestantes, poderá sugerir tolerância desses cultos em uma cidade basicamente católica, por um Estado que continua reconhecendo a verdadeira religião, porque acredita no Reino Social de Nosso Senhor Jesus Cristo.

Mas cuidado! para os católicos liberais não se trata disso! Segundo eles, os princípios, que são por definição regras de ação, não devem ser aplicados nem propostos porque são inaplicáveis, dizem. Isto é evidentemente falso.


Por acaso deve-se renunciar a pregar e a aplicar os mandamentos de Deus, "terás um só Deus", "não matarás", "não cometerás adultério", somente porque ninguém quer mais saber deles? Somente porque a mentalidade tende a se livrar de toda tutela moral? 

Deve-se renunciar ao Reino Social de Nosso Senhor Jesus Cristo num país somente porque Maomé ou Buda pedem um lugar nele? 

Em suma, eles se recusam a crer na eficácia prática da verdade. Pensam que podem afirmar em teoria os princípios católicos e agir sempre contra estes princípios. Esta é a incoerência intrínseca dos liberais que se dizem católicos. Eis o que diz deles o Cardeal Billot S.J.:

"O liberalismo dos católicos liberais escapa a toda classificação e só tem uma nota distintiva e característica: a perfeita e absoluta incoerência.” [2]

O Cardeal afirma que o título de "católico liberal" em si é uma contradição nos termos, uma incoerência, porque "católico" significa sujeição à ordem das coisas humanas e divinas, enquanto o de "liberal" significa precisamente emancipação desta ordem, rebelião contra Nosso Senhor Jesus Cristo.

Vejamos enfim como o Cardeal Billot julga a famosa diferença entre tese e hipótese, dos católicos ditos liberais:

"Do fato de que os acontecimentos reais diferem das condições ideais em teoria, se deduz que os fatos nunca terão a perfeição do ideal, porém somente isto."

Pelo fato de que existem minorias dissidentes em uma nação católica, conclui-se que talvez nunca se consiga uma unanimidade perfeita, e que o Reino Social de Nosso Senhor Jesus Cristo jamais terá a perfeição manifestada nos princípios; mas não se conclui que na prática se deva rejeitar este reino e que o pluralismo religioso deva se converter em regra! 

Vocês podem ver portanto que no catolicismo liberal (utilizo o termo com repugnância porque ele é uma blasfêmia) há uma escamoteada traição dos princípios, uma apostasia prática da fé no Reino Social de Nosso Senhor Jesus Cristo. Pode-se dizer com certeza: "o liberalismo é pecado"[3] quando se fala do liberalismo católico.

Há também no fundo deste problema um "confusionismo" intelectual, uma mania de se alimentar confusões, uma recusa de definição e clareza. 

Por exemplo esta confusão entre tolerância e "tolerantismo": a tolerância é um princípio católico e em certas circunstâncias é um dever de caridade e de prudência política para com as minorias; ao contrário, o que chamamos de "'tolerantismo" é um erro liberal que quer conceder indistintamente a todos os dissidentes, em qualquer circunstância e em justiça, os mesmos direitos que gozam os que estão na verdade moral ou religiosa. Como se pode notar também em outros aspectos, converter a caridade em justiça é subverter a ordem social, é destruir tanto a justiça como a caridade.



Uma doença do Espírito

Mais do que uma confusão, o catolicismo liberal é uma doença do espírito[4]. Simplesmente o espírito não consegue descansar senão na verdade. Basta que ele se atreva a afirmar algo para que se apresente a ele o contrário, que ele se sente obrigado a considerar também. O Papa Paulo VI é o protótipo deste espírito dividido, de um ser de dupla personalidade. Inclusive podia-se fisicamente ler isto em sua face, em constante vai e vem entre as contradições, e animado de um movimento pendular que oscilava regularmente entre a novidade e a tradição. Dirão alguns: Esquizofrenia intelectual?

Creio que o P. Clérissac viu a natureza desta doença em maior profundidade. É uma "falta de integridade de espírito", de um espírito que não tem "suficiente confiança na verdade"[5]:

"Esta falta de integridade de espírito nas épocas de liberalismo, se explica no lado psicológico por dois aspectos: os liberais são receptivos e receosos. Receptivos porque assumem com muita facilidade os estados de espírito de seus contemporâneos; receosos porque, por medo de contrariar estes diversos estados de espírito, se encontram em constante inquietude apologética; parecem sofrer eles mesmos as dúvidas que combatem, não têm suficiente confiança na verdade, querem justificar em demasia, demonstrar em demasia, adaptar demais ou mesmo desculpar em demasia."

  

Dom Marcel Lefebvre

Fonte: (Sim, Sim, Não, Não, edição em português, Nº 88, julho 2000.)







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[1] Dictionaire de Théol. Cat., T-9. col. 509. art. libéralisme catholique.

[2] Pe. Le Floch, pág. 57.

[3] Dom Felix Sardá y Salvany.

[4] Padre A. Roussel. Libéralisme et Catholicisme, p.16.

[5] Pe. H. Clérissac O.P, Le Mystère de L'Eglise, Cap. 7.



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