A PEQUENA VIRTUDE DO PASSAR DESPERCEBIDO
"Não existe caridade sem respeito mútuo, e esse respeito se traduz nas atenções que temos uns para com os outros. Mas, para que a cortesia reine no lar, é necessária uma segunda virtude, a pequena virtude de saber passar despercebido.
Ouvimos o conselho do Senhor: "Apaga-te diante dos outros. Se podes escolher, ocupa o último lugar". Não nos queixemos do conselho, pois assim estaremos mais perto de Cristo.
Mas - sempre há um mas - o nosso amor próprio sente-se injustiçado nesse passar desapercebido, e logo se põe a reivindicar os seus direitos, quando não os toma à força, o que ocorre com frequência. Ocultar-se? Desaparecer? Que ideia!
O amor próprio afirma-se, põe-se em evidência, instala-se, avoca tudo para si. E os outros? Dos outros só conhecemos aquilo que nos devem ou aquilo que deles podemos tirar.
Daí surgem os conflitos que arruínam o bom entendimento entre os homens. "Por que devo ser passado para trás? Por acaso serei menos capaz do que aquele outro?", pensará este. "Tenho as mesmas necessidades que aquele, e pelo menos os mesmos méritos", opinará outro. E não faltará quem diga: "Eu sou o chefe: como posso passar despercebido, se cabe a mim exercer a autoridade?"
E quase se chega à conclusão e que a humildade não pode ser tida por virtude, pois, se a puséssemos em prática, conduziria ao aniquilamento total da personalidade.
Ora, aí está algo que revela uma extrema confusão de ideias. O Evangelho é uma escola de grandeza e de audácia. Longe de nos aniquilar, obriga-nos, pelo contrário, a fazer render o máximo todas as nossas qualidades naturais, a nos colocar na primeira fila à hora de agir; mas, depois de termos agido o melhor que tenhamos podido, obriga-nos também a não nos damos importância. Esse é o primeiro aspecto da virtude do "saber apagar-se".
Lares infelizes são aqueles em que predominam duas horrorosas leis do "cada um por si" e do "primeiro eu". Cristo substituiu este reino do egoísmo pelo do amor, que implica esquecimento de si mesmo.
Nos lares cristãos, inverte-se a ordem egoísta: "primeiro vem os outros, depois eu". Encontramos a nossa felicidade em tornar felizes os outros. Em vez de nos apoderarmos da cadeira mais confortável ou de estarmos à espreita do melhor bife, cada um se empenha em oferecê-los aos outros e se alegra em dar-lhes esse prazer.
Os esposos sempre vivem em perfeita harmonia quando, antes de exprimirem um desejo, o marido e a mulher, cada um por sua conta, se perguntam interiormente: o que é que ela prefere? De que é que ele gostaria?
E os filhos, não devem eles pensar que o pai e a mãe renunciam inúmeras vezes às suas comodidades para lhes dar alguma satisfação? Os pais alegram-se com a felicidade dos filhos. E os filhos, por sua vez, não devem deixar passar nenhuma ocasião de adivinhar as preferências dos pais, e fazê-lo discretamente, sem que eles o percebam.Não hão de dizer: "ninguém pensa em mim, só eu que me sacrifico".
Numa família em que todos procuram passar despercebidos, ninguém se sacrifica. Não há necessidade de pensarmos em nós mesmos, porque os outros já o fazem, antes de que nós o façamos. Ninguém fica esquecido, quando cada um se esquece de si pelos outros.
"Mas isso seria o paraíso na terra!", dirá alguém.
Não há dúvida de que sim, e desejo de todo o coração que se faça a experiência."
Excertos do livro "As pequenas virtudes do lar" de Charles Chevrot
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